sexta-feira, 26 de setembro de 2014


ÌTÁN (LENDA) QUE FUNDAMENTA O ÒLÚBAJÉ

Sòngo era muito poderoso, além de explosivo, volúvel e voluntarioso.

Todos seus servos e esposas procuravam agradá-lo sempre, para não se verem expostos aos seus repentes de ira. Desejando fazer-lhe uma surpresa, suas mulheres oya, òsun e oba resolveram oferecer uma grande recepção, com tambores batá e muita comida, como ele
Gostava.

Os òrìsà foram convidados e, para que sòngo tivesse realmente uma surpresa, cada um traria a comida que preferisse para abrilhantar a festa. Chegou o grande dia, os deuses foram chegando e seus servos e esposas íam colocando balaios, gamelas e cabaças cheias de alimento nas esteiras do salão do palácio de òyó.

Sòngo ficou muito admirado e agradecido, mas antes de dar início à festa, perguntou por obalúwàiyé, ficaram todos desapontados, porque ninguém se lembrara de convidá-lo.

Imediatamente obàtálà, a pedido de sòngo, deu ordens para que se preparasse èpà (amendoim com muito molho de pimenta) e Èbà (mingau de farinha de mandioca e água), que cada òrìsà tomasse de novo seus pratos de oferendas e que rumassem para a terra de obalúwàiyé, que a festa seria então uma homenagem à ele.

Mas surgiu um problema. Como todos vinham reverenciar sòngo trazendo comidas, ele não teria alimento algum para carregar consigo e oferecer a obalúwàiyé. Era tarde para que ainda se ocupassem em cozinhar ilá (quiabo) ou sopa de gbegiri (massa de feijão fradinho).

Obàtálà resolveu facilmente a questão. Oya e òsun haviam preparado muito àkàrà (bolo de feijão fradinho com muita pimenta, frito no dendê), da preferência de ambas. Elas iriam partilhar com sòngo seus presentes para que ele não chegasse à casa de obalúwàiyé de mãos vazias.

E obàtálà disse ainda à oya que desse os àkàrà efetivamente para sòngo carregar e levasse a esteira mais grossa, mais bonita e mais nova que houvesse no palácio para que nela fosse colocada a comida. Foi um espanto geral! Sòngo, o grande rei, o poderoso que soltava fogo pela boca, carregando uma gamela de àkàrà na cabeça como uma mulher!

Ele encarou a coisa com muito bom humor e todos juntos, liderados por obàtálà, rodeado de servos que levavam milho branco cozido, de uma alvura incrível, seguiram serpenteando num grande cortejo pelo caminho, rumo às terras de obalúwàiyé.

À frente seguia èsù levando em sua cabeça tão somente um ìkódíde ( pena do pássaro odíde), e em seus braços muita carne de bode bem temperada, seguido de servos carregando com inúmeras cabaças de emu.
Chegando ao palácio real, chamaram obalúwàiyé, gritando: ilé gbí gbònòn ó! ( você que é a terra quente dos ancestrais!).

Obalúwàiyé surgiu, e ficou muito surpreso com a história que lhe contaram, de uma festa inesperada em sua honra. Disse então que na véspera, ojo awo, seus bàbáláwo haviam previsto exatamente o que estava acontecendo. E que ele era a terra, tendo se esquecido dele, haviam se esquecido da terra, e também dos seres humanos, dos quais a terra é matéria prima. Sugeriu então que a esteira fosse colocada no chão da praça da aldeia, e que todos seus habitantes fossem convidados a compartilhar do banquete, sem exclusão.

Oya não cedeu a ninguém a honra de carregar e estender a esteira, e por isso recebeu de obàtálà, o pai velho e sábio, o oyè (cargo) de ìyálení (a mãe que carrega a esteira). Todos comeram e beberam com fartura, dançaram e cantaram em louvor a obalúwàiyé e sua família, recitaram oríkì (versos de louvação) sobre seus feitos e de seus familiares.

Sòngo era o mais alegre, o que se movia mais majestosamente na dança do òpáníjé (a terra que recebe os mortos e os devora – mata e come). Tudo isso por que seu irmão dileto sonpònòn (varíola), cujo nome era perigoso de ser falado, o que só era chamado pelos nomes de louvação omolu (filho de deus), obalúwàiyé (rei do planeta terra), jeholu (senhor das pérolas) e tantos outros, compreendera o esquecimento dos òrìsà e não ficara bravo.

Assim as árvores dariam frutos, os animais se reproduziriam e as mulheres teriam filhos.

Os homens Valentes voltariam da guerra vitoriosos e juntos louvariam olódùmarè, o deus criador que vivia isolado no òrun, ao findar o dia, obalúwàiyé propôs que todos os anos, no período das chuvas leves, quando a terra se abrisse para deixar sair seus frutos, essa confraternização se repetisse.

Enquanto òrìsà habitar ìlú àiyé (o planeta terra), vivendo nos templos, no okàn (coração) e no orí (cabeça) dos seres humanos, haverá o festival do olúgbàje (o deus abençoa os alimentos), em louvor à terra que dá as comidas de homens e de òrìsà.sòngo resolveu então que, não tendo oferecido ilá e sim àkàrà no primeiro olúgbàje, assim faria sempre. E todos cantam até hoje:

A! E! Olúgbàje, olúgbàje a je n'bo. A! E! Olúgbàje,
Olúgbàje a je n'bo.

O deus abençoa as comidas. O deus abençoa as comidas, vamos Louvar o alimento.

"Atótóo omolú obalúwàiyé omo òrìsá ale
Bàbá soroso egúngún olá òrìsà
Sonpònòn kò si kú kò si àrùn."

(silêncio em louvor a omolú obalúwàiyé, filho do òrìsà cultuado em ale, pai magro e alto, ancestral da riqueza, que não haja morte, que não haja doença).

Asé! Asé! Asé!
oloje iku ike obarainan

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